A presidente Dilma Rousseff vetou ontem nove das principais mudanças no Código Florestal propostas pelo Congresso e abriu uma nova frente de batalha com a bancada ruralista na Câmara dos Deputados, que diz ter sido traída pelo governo. Recuperando o texto original da medida provisória (MP), o decreto presidencial revoga o item que alterava a chamada “escadinha” para diminuir a área de recuperação de florestas nas margens dos rios e regulamenta o Cadastro Ambiental Rural (CRA) e o Programa de Recuperação Ambiental (PRA).

“Todos os vetos foram fundamentados na recuperação dos princípios da medida provisória de não anistiar, não estimular o desmatamento ilegal e estimular a justiça social no campo”, disse a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira. “Foi vetado tudo aquilo que leva ao desequilíbrio social e ambiental.”

Os vetos incluem a proibição de usar árvores frutíferas para a recuperação de áreas degradadas dentro das Áreas de Preservação Permanente (APPs) e a exclusão de um artigo que definia uma área de 5 metros na recuperação nas margens de rios intermitentes de até 2 metros de largura em propriedades de qualquer tamanho.

A maior questão para os ruralistas, no entanto, é mesmo o tamanho das áreas de preservação em margens de rios. A versão final que saiu do Congresso, em uma enorme derrota para o governo, diminuiu a obrigação da recomposição para médias e grandes propriedades.

“O que houve foi um golpe por parte do governo, que aproveitou as partes do texto que lhe convinha”, acusa o deputado Homero Pereira (PSD-MT), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). “Esperávamos apenas vetos cirúrgicos, como na questão das árvores frutíferas. Mas, com os vetos, a presidente desconsiderou posicionamento tomado por unanimidade pelo Congresso.”

Segundo ele, a bancada ruralista vai dar uma resposta “legislativa, jurídica e política” ao governo para tentar anular o veto de Dilma, ameaçando entrar na Justiça para alegar inconstitucionalidade da lei.

Disputa. Na versão recuperada pelo decreto presidencial que será publicado hoje no Diário Oficial, o governo quer a recuperação de 20 metros em cada margem em rios com até 10 metros de largura nas médias propriedades (de 4 a 10 módulos fiscais). Em propriedades com até 10 módulos fiscais, se o rio for maior que 10 metros, e em áreas maiores que essas, com rios de qualquer tamanho, a recuperação será equivalente à metade da largura do rio, com um mínimo de 30 metros e máximo de 100 metros. A mesma regra vale para as grandes propriedades.

Na versão do Congresso, a área a ser recuperada nas médias propriedades seria de 15 metros em qualquer caso e, nas grandes propriedades, a faixa mínima passaria a ser de 20 metros e o tamanho máximo passaria a ser regulado pelos Estados. Na avaliação do governo federal, as alterações tinham potencial de reduzir significativamente o tamanho das matas ciliares.

O advogado-geral da União (AGU), Luiz Inácio Adams, diz que as mudanças feitas pelos parlamentares permitiram a edição do decreto presidencial quando passaram a regulamentação do Cadastro Ambiental Rural e o Programa de Recuperação Ambiental para as disposições transitórias da lei. “Essa previsão não existia na versão anterior, por isso não foi feita”, explica.

O chamado CAR é um cadastro em que todos os produtores precisarão se inscrever para regularizarem sua situação ambiental. Depois de inscritos, o governo avaliará as propriedades para ver quais precisarão estar no PRA e definir o que precisa ser recuperado. É nesse ponto que a AGU viu a brecha para tratar a escadinha como parte da regulamentação do CAR e do PRA.

O outro ponto vetado foi a inclusão, na Câmara, da possibilidade da recuperação das áreas ser feita com árvores frutíferas não nativas. De acordo com a ministra do Meio Ambiente, a possibilidade do uso de frutíferas nativas intermitentes com outras árvores das regiões está prevista. O que o governo não quer é ver as APPs transformadas em pomares.

No total, a presidente vetou 9 de 84 itens da MP aprovada em setembro pelo Congresso.

Fonte:  jornal “O Estado de S. Paulo”, em 18/10.